quarta-feira, 2 de novembro de 2011

SOPHIA = POESIA

SOPHIA = POESIA

Esta semana é a semana de Sophia. No momento em que escrevo esta crónica encontro-me a caminho da inauguração da exposição Sophia de Mello Breyner Andresen – Uma Vida de Poeta, à Biblioteca Nacional de Portugal, em Lisboa. A exposição, constituída pelo vasto espólio que a sua família doou àquela instituição, retrata a sua vida e obra.
Sophia nasceu no Porto em 1919 e faleceu em Lisboa em 2004. Mas a poetisa dispensa apresentações, é uma figura incontornável na literatura portuguesa. A sua obra é vasta e centra-se sobretudo na Poesia e nos contos para crianças. Não vou aqui elencar as suas publicações, porque estão ao dispor de quem quiser procurá-las em qualquer livraria.
Mas recordo as suas histórias como fazendo parte da minha infância: O Rapaz de Bronze, A Menina do Mar, a Floresta, o Cavaleiro da Dinamarca, entre outras. Sophia disse que começou a escrever histórias para crianças porque as que encontrava para ler aos seus filhos apresentavam uma linguagem demasiado infantil.
“Na minha infância, antes de saber ler, ouvi recitar e aprendi de cor um antigo poema tradicional português, chamado Nau Catrineta. Tive assim a sorte de começar pela tradição oral, a sorte de conhecer o poema antes de conhecer a literatura. Eu era de facto tão nova que nem sabia que os poemas eram escritos por pessoas, mas julgava que eram consubstanciais ao universo, que eram a respiração das coisas, o nome deste mundo dito por ele próprio.” De facto, as histórias têm um papel fundamental na educação das crianças. Devemos ler-lhas, mas, também que elas as saibam de cor e, isto, sim, na minha opinião, está a passar ao lado de pais e educadores.
Mas embora a sua obra seja sobejamente conhecida é apenas lida ocasionalmente nos manuais do 1º e 2º ciclos. A nível académico falta ainda muito que fazer para estudar a sua obra, pelo que a doação do seu espólio à Biblioteca Nacional e o congresso dos dias 26 e 27, na Fundação Calouste Gulbenkian, Colóquio Internacional Sophia de Mello Breyner Andresen, irão ser fundamentais para divulgar ainda mais as suas obras, bem como o estudo que a sua filha Maria Andresen tem feito à obra da mãe. Ficará a porta aberta a futuras investigações académicas que permitirão conhecer o verdadeiro mundo de Sophia.
Sophia que, dedicando toda a sua vida à literatura e à família, não se coibiu de ter um papel activo na sociedade antes e depois do 25 de Abril. Aliás, foi na qualidade de deputada que afirmou: “A cultura é uma das formas de libertação do homem. Por isso, perante a política, a cultura deve sempre ter a possibilidade de funcionar como anti-poder. E se é evidente que o Estado deve à cultura o apoio que deve à identidade de um povo, esse apoio deve ser equacionado de forma a defender a autonomia e a liberdade da cultura para que nunca a acção do Estado se transforme em dirigismo.”
Da vida confessou: “A vida não me foi madrasta, tive que sofrer como toda a gente”.
Deixo-vos um convite para reler a sua obra e, sobretudo, conhecer uma mulher excepcional que deixará o seu nome gravado na imortalidade dos grandes, daqueles que o tempo não esquece. São dela estas palavras:

Mais tarde será tarde e já é tarde.
O tempo apaga tudo menos esse
Longo indelével rasto
Que o não vivido deixa.

Aceitemos este convite. Hoje e agora. Para que não restem arrependimentos de não termos vivido, de não termos saboreado as suas palavras uma a uma, com deleite, prazer, serenidade, mas também com fúria e raiva, sentimentos que a atravessaram e que deixou impressos nas suas palavras. Para todos nós. Foi ela que disse para não termos medo das palavras:

Com fúria e raiva acuso o demagogo
E o seu capitalismo das palavras

Pois é preciso saber que a palavra é sagrada
Que de longe muito longe um povo a trouxe
E nela pôs sua alma confiada.


Anabela G.
In Jornal Renascimento, 1 de Fevereiro de 2011 e http://www.eacfacfil.net/

2 comentários:

  1. Tal como o texto sobre "O carteiro de Pablo Neruda" gostei da crónica sobre Sofia. Os contos de Sofia são para mim uma escrita maravilhosa. É fantástica a forma clara e simples como escreve. Tudo me parece poesia!
    Adorei dá-los a conhecer aos pequenos leitores da BMM, adorei lê-los às minhas filhas e adorei que elas os adorassem.

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  2. Tenho muitas memórias das obras desta escritora de livros que li quando andava no ciclo (há imenso tempo). A "Fada Oriana", a "Menina do Mar"e tantos outros emprestaram fantasia e cor à minha infância...Ainda hoje relembro com muita saudade esses tempos :)

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