quinta-feira, 5 de janeiro de 2012

Os enigmas de Wittgenstein – e a descoberta de um tesouro…

Ainda há descobertas que nos entusiasmam…
Foi recentemente encontrado um verdadeiro tesouro, um daqueles achados que podem esclarecer e até modificar o conhecimento que temos de um autor de que julgávamos conhecer as suas ideias. Estou a falar de um dos filósofos do século XX que pessoalmente mais interesse me suscitou, Ludwig Wittgenstein. Poder-se-á dizer que a sua filosofia não foi uma, mas duas, correspondentes às duas únicas obras publicadas, Tractatus Logico-Philosophicus, a única publicada em vida e Investigações Filosóficas, publicada após a sua morte e onde o seu pensamento se radicaliza em ópticas completamente opostas.
Pois foi descoberto um novo espólio em casa de um dos seus alunos, onde permaneceu incógnito até agora, o que nos deixa a esperança de conhecer mais do seu pensamento científico e das suas extraordinárias reflexões.
Não comecei propriamente por compreender Wittgenstein, até que vi um documentário sobre a sua vida, intitulado precisamente Wittgenstein, do realizador Derek Jarman, filme que recomendo vivamente a quem se quiser iniciar no pensamento daquele autor.
Neste documentário o realizador, além de nos permitir espreitar um breve olhar sobre a vida pessoal do filósofo, abre-nos igualmente a porta da sua obra e pensamento e da sua intensa e persistente busca de certezas e respostas, na ciência que apelida de “doença da alma”, a Filosofia. O realizador procura desvendar-nos algo sobre várias vertentes do pensamento de Wittgenstein, nomeadamente a Filosofia, a Linguagem, a Religião e os seus próprios afectos.
Sobre a linguagem acredita o filósofo em Tractatus Logico-Philosophicus que aquela dá-nos a imagem do mundo mas não nos pode dar a imagem de como o faz. Seria como tentarmos ver-nos a observar qualquer coisa! A forma como a linguagem o faz é inexplicável. É esse o mistério. Mas isso estava completamente errado, concluiu mais tarde o segundo Wittgenstein, como muitos autores se referem à segunda parte da sua obra. A linguagem não é uma imagem. É uma ferramenta, um instrumento. Não há apenas uma linguagem no mundo. Há muitos jogos de linguagens diferentes. Diferentes formas de vida e formas de fazer coisas com palavras… não está tudo junto! Afirma: “os limites da minha linguagem são os limites do meu mundo. (…) Estamos sempre a esbarrar contra as paredes da nossa jaula”.
O autor abandonou a ideia de que a linguagem era uma imagem, porque tal é uma metáfora enganadora. Mala é a imagem de mala… mas e “olá” e “talvez”? Que imagem nos ? Continuando a reflectir sobre os limites da linguagem e o que significa comunicar, persuade-nos que o sentido das palavras provém daquilo que fazemos e daquilo que somos. “Não posso perceber a linguagem de um leão pois desconheço o mundo dele. Como posso conhecer o mundo que ele habita? Será por não poder espreitar-lhe a mente”?
Wittgenstein acredita que há a necessidade de dominar um jogo de linguagem. Em cada âmbito de uma certa actividade há palavras com semelhança de família, que é imprescindível dominar. Contudo, o jogo de linguagem pode com o tempo alterar-se, caducar, o que implica uma alteração de vocabulário e também de gramática. E refira-se que gramática para o autor, não é apenas a sintaxe, mas todo o contexto, incluindo as regras do seu uso.
O jogo de linguagem pressupõe igualmente formas de vida. O ser humano tem a capacidade de projectar a sua vida para além do humano e, para Wittgenstein, necessariamente na Arte. Isso implica a capacidade de alargar os nossos horizontes para além do imediato, até porque o ser humano exige Arte. E não é uma opção. É uma necessidade muito humana, porque transmite um sentido de identificação a algo maior, uma excitação que exalta os sentidos e a mente.
Fascinante? Imaginem então o que nos espera quando os investigadores nos esclarecerem sobre as novas reflexões de Wittgenstein, o tal tesouro recentemente achado. Sim, achado… Aqui está uma linguagem que gosto de utilizar….
No próximo artigo falarei sumariamente, como não poderá deixar de ser nestas breves linhas, nas reflexões do autor sobre Religião e Filosofia. Sobre esta dizia o autor que não evoluiu nem um bocadinho desde Platão: “Será que isso se deve à inteligência de Platão”?
E ainda há quem diga que os filósofos não têm humor…

Anabela G.
Publicado in Jornal Renascimento e http://www.eacfacfil.net/

Sem comentários:

Enviar um comentário